Como os atletas lidam com a diferença de horários no esporte que passará por 21 países diferentes em um período de nove meses em 2024?
Escrito por Vitória Vilarino
Revisado por Isadora Guerra
Que a Fórmula 1 não é para qualquer um todos já sabem: altas temperaturas, força g e pressão psicológica são só alguns dos desafios enfrentados pelos pilotos. Porém, um fator que passa despercebido é o famoso jet lag. No ano de 2023 foram 22 corridas em 20 países diferentes com diversos fusos horários, o que impacta diretamente não apenas a performance dos atletas, mas também a saúde física. O jet lag é um distúrbio temporário do sono. Ocorre quando o relógio biológico do corpo está fora de sincronia com os sinais de um novo fuso horário. Pode haver desorientação relacionada à exposição à luz e aos horários das refeições. Fadiga e dificuldade de concentração são alguns dos sintomas.
Ou seja, esse distúrbio pode afetar seriamente o organismo do ser humano alterando o humor, o sono e a concentração, o que para um piloto de Fórmula 1 pode se transformar em perda de pontos importantes no campeonato. Em uma das coletivas de imprensa da temporada passada, o piloto da Mercedes, George Russell, afirmou que estava sofrendo bastante com as mudanças de horário. O britânico constatou um aumento de 25% na sua frequência cardíaca durante a temporada em comparação aos momentos em que fica por um período mais longo em um mesmo fuso.
Uns sofrem, outros nem tanto
O jet lag entrou em alta durante o GP de Las Vegas de 2023, quando os pilotos deveriam enfrentar uma corrida nova, cheia de eventos e apresentações para em menos de 7 dias estarem em outro país com 12 horas de diferença. Muitos deles reclamaram dessa disposição das corridas e outros mostraram-se conformados com a situação. Nico Hulkenberg, da Haas, afirmou que esse desafio se apresenta para todos. Alguns lidam melhor e outros nem tanto, mas todos têm de enfrentá-lo da forma que conseguirem. Max Verstappen, da Red Bull, foi um dos que mais criticou a organização do campeonato neste quesito, enquanto Lando Norris, da McLaren, afirmou não sentir tanto os efeitos pelo fato de que ainda é bem jovem.
Outro piloto que admitiu não sofrer com as mudanças de horário foi Lewis Hamilton, da Mercedes, que durante as coletivas de imprensa de Las Vegas foi alvo de brincadeiras do piloto da Red Bull, Checo Pérez, que disse estar pensando em pedir as “pílulas para dormir” que Hamilton estava tomando, uma vez que parecia ser o único que não estava sofrendo com o fuso.
O campeonato e seus desafios
A Austrália é um país particularmente difícil, pois Melbourne (sede do GP da Austrália) está 11 horas à frente do Reino Unido, que é onde mais de 50% das equipes estão sediadas. A F1 também visita países como o Japão e o México, que têm uma diferença de fuso horário de mais de cinco horas em relação ao Reino Unido, o que significa que as equipes e os pilotos têm certas maneiras de combater os efeitos do jet lag.
Alguns desses circuitos também têm um fuso significativamente diferente do outro, como Xangai, que está 12 horas à frente de Miami, e as duas corridas estão separadas por apenas algumas semanas no calendário. Um fim de semana de GP, por exemplo, normalmente vai de quinta a domingo, o que significa que as equipes e os pilotos não ficam muito tempo no mesmo local, especialmente quando as corridas são em fins de semana consecutivos.
Despistando o jet lag
Uma das artimanhas utilizadas por Hamilton é fazer um treinamento adaptado para ele, mas que foi criado para astronautas da NASA. Com a ajuda do médico Aki Hintsa e do professor especialista em neurociência, Steven Lockley, o piloto criou uma rotina para se adaptar aos diferentes horários dos países que passa. Dentre as medidas estão tomar a versão sintética da melatonina (hormônio que regula o sono) e controlar a exposição à luz e à escuridão. Inclusive, Lewis se apresenta muitas vezes de óculos escuros durante os finais de semana sob recomendação de Hintsa para controlar a exposição à claridade e regular o ciclo circadiano.
Lewis usa óculos escuros para controlar exposição à luz solar, mas mesmo assim sofre com jet lag. Fonte: Racing News
Estudos mostram que para cada 1 hora de fuso é necessário 1 dia para adaptação, porém, sabe-se que esses atletas não têm esse luxo. Daniel Ricciardo, da Racing Bulls, também deu sua opinião sobre o fuso horário. Segundo ele é possível se preparar um pouco, já que muitas pessoas acreditam que com o tempo o piloto se habitua com essas mudanças.
Carlos Sainz, da Ferrari, postou um tutorial de como lidar com jet lag, em uma sequência de stories, onde compartilhou dicas de como ele faz para se adaptar ao horário de Melbourne. O plano consistia em ficar acordado durante a primeira parte da viagem, que era um voo de sete horas para Dubai, porque era tarde da manhã em Melbourne, mas já noite na Europa. Para não cair no sono, Sainz se certificou de que houvesse muita luz e se manteve entretido com filmes e conversas.
Na escala em Dubai, mais uma vez, Sainz tentou se expor o máximo possível à luz para ficar acordado antes de evitar dormir também no segundo voo. Dessa forma, ele poderia descansar quando fosse noite em Melbourne, o que ajustaria seu relógio biológico aos horários da corrida.
Em resumo, os pilotos de F1 utilizam métodos diferentes para combater o jet lag porque a capacidade de se adaptar rapidamente pode ter resultados extremamente benéficos. Nico Rosberg é um exemplo, pois o ex-piloto da Mercedes procurou ajuda especializada para superar o jet lag na temporada de 2016, quando venceu o campeonato de F1, e seus métodos são amplamente utilizados entre equipes e pilotos atualmente.
Exercícios logo após acordar, ou uma sessão leve antes de dormir, também podem ajudar muito a ajustar o relógio biológico. Por isso, muitos pilotos vão jogar golfe, pois a exposição à luz natural e o fato de não ser muito intenso são altamente benéficos. A cafeína é outra ferramenta utilizada para combater o jet lag. Isso ocorre porque ela é um estimulante que faz com que a pessoa se sinta mais acordada, pois bloqueia o receptor de adenosina, que é uma substância que promove a sonolência. Porém, ela não é muito respaldada e indicada pelos médicos.
Fontes
https://theathletic.com/4370084/2023/04/01/formula-one-drivers-travel-jet-lag-australian-grand-prix/
Comments