Mesmo com grandes feitos no esporte, seu nome sempre esteve atrelado a grandes escândalos
Escrito por Ana Luiza Queiroz
Revisado por Isadora Guerra
A história da F1 pode ser contada através de muitos nomes, lendas, mitos, heróis e vilões. Dentre estes nomes que deixaram sua marca no esporte, Flavio Briatore definitivamente é uma personalidade que não será esquecida facilmente. Após anos de seu banimento e afastamento, ele retorna ao esporte em 2024 como conselheiro da equipe Alpine, que antes era conhecida como Renault.
Responsável por grandes feitos na F1, Flavio Briatore, 74 anos, é um empresário italiano reconhecido internacionalmente como chefe de equipe das escuderias Benetton F1 e Renault. Além de ter sido chefe de equipe também ficou conhecido como um grande caça-talentos, sendo empresário de vários pilotos renomados. Entre seus pupilos estão o bicampeão mundial Fernando Alonso, Heikki Kovalainen, Jarno Trulli, Mark Webber e Nelsinho Piquet.
Briatore também tinha os holofotes sobre si na vida pessoal. Atuando como comercial de moda, acabou por se envolver social e amorosamente com as supermodelos Adriana Volpe, Elle MacPherson, Heidi Klum (com quem tem uma filha chamada Leni), Linda Santaguida, Naomi Campbell, Vanessa Kelly, Valentina Micchetti e Elisabetta Gregoraci.
O italiano e seus grandes talentos. Ao lado, posando com a supermodelo Heidi Klum, com quem namorou por um tempo e teve até uma uma filha. Fotos: Reprodução
Trabalhou ainda com o heptacampeão Michael Schumacher no começo de sua carreira, quando era diretor técnico da Benetton, equipe onde Schumacher conseguiu seus dois primeiros títulos mundiais da carreira. No entanto, mesmo com grandes feitos no esporte, seu nome sempre esteve atrelado a grandes escândalos.
Como tudo começou
Briatore era diretor comercial da multinacional de vestuário Benetton e foi convidado por Luciano Benetton para assistir pela primeira vez a um GP de Fórmula 1, o GP da Austrália de 1989. Logo depois, passou a integrar a equipe Benetton, aprendeu tecnologia com Ross Brawn, um dos maiores e mais vencedores diretores da história da F1, gerência com Tom Walkinshaw, e angariação de pilotos como Michael Schumacher.
Cinco anos depois, em 1994, conseguiu levar a Benetton, até então uma equipe de meio da tabela, ao título do mundial de pilotos, apesar da exclusão de Schumacher em quatro Grandes Prêmios. Nenhum outro piloto na história da Fórmula 1 havia sido campeão com aquele carro, somando tantas penalizações.
Schumi e Briatore comemorando o título dele em 1994. O piloto formava um trio embatível com Ross e Flavio na Benetton. Fotos: Reprodução
Porém, os métodos duvidosos de Flavio Briatore começaram a se manifestar em sua segunda temporada comandando a Benetton na Fórmula 1. Em 1991, o dirigente demitiu Roberto Moreno e colocou o então novato Michael Schumacher em seu lugar, durante a temporada, no GP da Itália. O veterano brasileiro sequer foi avisado da decisão da equipe. Nesta época, ele corria ao lado do tricampeão Nelson Piquet.
Ladeira abaixo
Daí pra frente, foi só pra baixo. Em 1994, uma série de denúncias contra a Benetton manchou o primeiro título de Schumacher na F1. A categoria reestreava o reabastecimento, que viria a ser decisivo na estratégia das equipes. Briatore mandou tirar o filtro das máquinas de sua equipe, o que acelerava o processo, mas o tornava muito inseguro. A falcatrua foi descoberta após o incêndio no carro de Jos Verstappen no GP da Alemanha, em Hockenheim.
Ainda no mesmo ano, a Benetton foi acusada de usar dispositivos eletrônicos proibidos disfarçados em seu carro, como o controle de tração e de largada. Schumacher ainda colocou a cereja no bolo, ao conquistar o campeonato jogando o carro sobre Damon Hill, da Williams, no circuito de rua de Adelaide, na Austrália. Naquele ano, a Austrália encerrava o campeonato mundial.
No fim da temporada de 1994, Briatore comprou a francesa Ligier para adquirir o direito de uso dos motores Renault, os melhores da época. O regulamento da FIA não permitia que ele fosse o dono da equipe e ele repassou o time a Tom Walkinshaw, dono da TWR, também conhecido por manobras duvidosas em outras categorias.
O título de Schumacher em 1995 foi o último brilho desta época da Benetton. A saída do alemão, junto com vários membros da equipe técnica, colocou o time na metade do grid. Em 1996, Briatore comprou uma parte da Minardi, mas não conseguiu vendê-la como o esperado. No ano seguinte, ele foi demitido da Benetton.
Era Renault
Já como chefe de equipe da Renault em 2003, Briatore demitiu Jenson Button e colocou Fernando Alonso, seu piloto, na vaga na Renault. Em 2009, Briatore protagonizou a grande polêmica de sua carreira junto ao brasileiro Nelsinho Piquet. Insatisfeito com o desempenho do piloto, o dirigente chegou a ameaçar demiti-lo pouco antes da largada das corridas. Após o GP da Hungria, ele foi desligado do time e acusou o empresário de ser seu carrasco, tomando 20% de seu salário.
Em entrevista ao jornal inglês "Daily Mirror", Nelson Piquet disse que avisou a FIA, ainda em 2008, durante o GP do Brasil, sobre a manobra da Renault para manipular o resultado no Grande Prêmio de Singapura de 2008. Piquet disse que relatou o caso ao diretor de prova, Charlie Whiting, mas não entrou em contato com o presidente da FIA, Max Mosley, por medo de prejudicar a carreira de seu filho, Nelsinho.
Foi um dos episódios mais escabrosos da história do esporte: Briatore e o engenheiro chefe da Renault, Pat Symonds, teriam premeditado o acidente de Nelsinho no GP de Singapura para favorecer Fernando Alonso no mundial (contra Felipe Massa, considerado campeão moral daquele ano). A equipe havia chamado Alonso mais cedo aos boxes. Duas voltas depois, na curva 17, Nelsinho perdeu a traseira do carro, bateu no muro e escapou para o outro lado da pista, onde não havia como retirar o carro sem a entrada do Safety Car.
Como somente Alonso havia feito a parada para reabastecer e trocar pneus, o acidente lhe foi favorável: voltou à competição em primeiro lugar e ganhou a corrida. Este incidente ficou conhecido como “Singapuragate” e seus desdobramentos são vistos até hoje.
Mas por que é tão marcante para os brasileiros? Porque com a batida de Nelsinho, Massa, que liderava a prova, foi convocado pela Ferrari para ir aos boxes. No entanto, a equipe, durante o pit stop, liberou o piloto antes de ter terminado o reabastecimento. Massa saiu com a mangueira presa ao veículo e, por isso, teve que parar no pit lane. Depois desta grande confusão, o ferrarista bateu em Adrian Sutil, da Force India, o que lhe ocasionou ainda uma punição, além de quase um minuto perdido.
Para piorar a situação, Felipe teve um pneu furado na parte final da prova e precisou voltar para os boxes. A diferença de um ponto para o heptacampeão aumentou para sete, faltando três corridas para o fim. A prova terminou com Lewis Hamilton em terceiro e o piloto brasileiro em 13º. No fim das contas, Massa perdeu o título para Lewis por apenas um ponto, colocando fim no mundial tão sonhado pelos brasileiros após a era de sucesso de Ayrton Senna.
Consequências do “Singapuragate”
No dia 10 de setembro de 2009 foi divulgada a reprodução do documento contendo as declarações de Nelsinho Piquet em seu depoimento à FIA e aos investigadores da Quest, empresa contratada pela entidade para investigar o acidente. No dia 16 de setembro do mesmo ano a Renault anunciou a demissão de Flavio Briatore e Pat Symonds, embora o caso ainda não tivesse sido julgado pela FIA.
No dia 21 de setembro, a FIA anunciou o banimento de Flavio Briatore da Fórmula 1 e do automobilismo mundial, perdendo inclusive o direito de empresariar pilotos. Já o ex-chefe de equipe, Pat Symonds, recebeu uma suspensão de cinco anos (hoje ele é diretor técnico da F1). Nelsinho Piquet foi absolvido por colaborar com as investigações e Fernando Alonso foi inocentado.
Porém, este caso ganhou um novo capítulo em 2023. Em março, o ex-chefão da categoria, Bernie Ecclestone, declarou que tanto ele, quanto Max Mosley, que era presidente da FIA, sabiam o suficiente para investigar o “Singapuragate”, pois foram informados de tudo ainda em 2008. No entanto, optaram por não fazê-lo para resguardar a imagem do esporte.
Após a declaração, Massa enviou uma carta para a FIA e a F1, uma medida obrigatória no Reino Unido antes do ajuizamento de uma ação judicial. O documento aponta que o ex-piloto seria campeão por direito em 2008, sendo vítima de uma conspiração das entidades por ocultar o teor intencional da batida em Singapura e falharem com o próprio regulamento. O processo iniciado em maio de 2024 envolve a FIA e a Formula One Management (FOM), além de Ecclestone.
O valor exato das indenizações ainda é incerto. Nas duas ações, Massa pede o valor que receberia da Ferrari pelo título, algo em torno de 2 milhões de euros, pouco mais de R$ 10 milhões, além de valores estimados de patrocínios, que receberia se tivesse ficado em primeiro lugar, além da diferença de salário que receberia como campeão. O valor total, segundo as estimativas, é de ao menos milhões de libras, ou R$ 408 milhões. Até agora nada foi definido.
Flavio Briatore na Alpine
Desde janeiro de 2010, o Tribunal de Grande Instância de Paris anulou o banimento imposto ao Briatore pela FIA, permitindo que ele voltasse a trabalhar novamente na Fórmula 1. Desde então, ninguém tinha optado por convidá-lo a entrar no mundo da F1 de novo. Até que no dia 21 de junho de 2024, surpreendentemente, a BWT ALPINE F1 TEAM anunciou a volta de Briatore à categoria como consultor da equipe. Vale lembrar que a Alpine é a antiga Renault, ainda com fabricação própria de seus motores.
Quais serão os próximos desdobramentos deste nome dentro do esporte?
Fontes